Quando vivia no campo

Era uma vez, sou um ser humilde, nascido e criado no campo, no meio das vacas e das cabras lá da aldeia sendo que algumas até eram bem maneirinhas e propícias para umas boas afifalhadelas!
Durante o ano frequentava a escola com as vacas e as cabras lá da aldeia que eram assediadas pelos burros dos meus colegas e a minha vida era feita de escola, trabalhos de casa, acartar estrume e desbulhar as espigas e só ao fim de semana é que tinha algum tempo para mim, onde aproveitava para brincar às escondidas sozinho e quase sempre me encontrava. Houve uma vez que me escondi tão bem, que tive dois dias sem aparecer em casa e tive que dizer bem alto: - "Arrebenta a bolha!!!" (sim, arrebenta que é o mesmo que rebenta mas com mais ênfase) para eu aparecer senão nunca mais aparecia.
Durante as férias das aulas, ficava sempre a trabalhar na quinta, na sexta, no sábado, no domingo, na segunda, na terça e na quarta.
Durante o dia pegava no tractor com a cisterna atrelada e regava as hortalicias (hortalicias é a junção de plantas da horta com delícia) e o milho. À noite deslargava a cisterna, montava o atrelado e ia com os meus amigos na maior das nossas pintas, com a melhor das nossas roupas e com as galochas engraxadas com um pano com água quente e sabão e íamos para a porta do café ver os nossos pais a beber o café com cheirinho. Nós apenas ficávamos pelo cheirinho a estrume porque não tínhamos dinheiro para tomar o que quer que fosse. Apenas tomávamos atitudes.
Numa dessas noites, conheci duas garinas, a Firmina Ancinho (Ancinho porque tinha os dentes tão afastados uns dos outros que se fosse com ela para o campo e a arrastasse pelos pés, ela só com os dentes lavrava-me o campo todo) e a Suzette Enchada (Enchada porque tinha o aparelho reprodutor mesmo muito enchado devido à coça e à vida que ela levava) e parecia um camião TIR porque tinha muitos pneus. Com as duas no meu colo em cima do tractor arranquei de gás e fui com elas as duas passear pela aldeia. Parámos no meio do monte e logo de seguida arranquei de gás as saias às duas. Às três comecei por lhes por a mão nos gémeos muito devagarinho e às quatro pus a mão no joelho ao que ela me disse: -"Podes ir mais longe!" então aí engatei a 4a e andei mais 20km até Serdozelo do Souto.
A chegar a Serdozelo já estava meio perdido meio encontrado, elas as duas sempre a funderem-me a cabeça e eu disse: -"Por falar em funder, funderam-me as duas lâmpadas!"
Como elas nunca mais se calavam, mandei-lhes dois murros e as lâmpadas voltaram a funcionar. Devia ser mau contacto (não tinha marcado o 91 em antes).
Lá começamos os 3 no engodo, agora engodo eu, a seguir comes tu com o engodo, liguei a chaufage mas mesmo assim os vidros do tractor que não tinha vidros começaram a embaciar, elas já estavam a morder o anzol até que os meus amigos que iam atrás disseram para irmos embora porque estavam a ficar com frio e no dia seguinte de manhã tinham que actuar na orquestra do Grupo Columbófilo e Recreativo de Cerejeiro de Anciâes e alguns já ensaiavam bufando na flauta dos outros.
Cheguei a casa, o meu pai estava a minha espera e perguntou-me:- "Já chegastes? Aonde é que andastes até às tantas?"
-"No tractor!"
-"Ah tá bem. Vai dormir mas deixa o ancinho e a enchada no barracão!!!"
Sempre quis começar um texto por "era uma vez".